Mauro Santayana
A descoberta de que prefeitos, advogados e até um juiz se mancomunaram, a fim de desviar dinheiro do Fundo de Participação dos Municípios, não chega a surpreender. A Controladoria-Geral da União tem encontrado casos escabrosos de favorecimento, superfaturamento de obras, despesas fictícias, notas falsas, em grande número de prefeituras. Os prefeitos incompetentes costumam ser os mais corruptos, mesmo porque a honestidade é uma forma de eficácia.
Ainda que houvesse alguma prodigalidade e favoritismo em essa ou aquela cidade, a administração municipal, nos 20 anos anteriores ao regime militar, era melhor. As cidades pequenas, como sempre, estavam dominadas pelas oligarquias rurais, e o desvio, em seus parcos orçamentos, não causava escândalos, embora houvesse prodigalidade e renúncia fiscal em favor dos amigos. Nos municípios maiores, as oligarquias rurais foram substituídas, a partir de 1945, pela classe média urbana, que elegia a maioria dos vereadores e dos prefeitos. Os candidatos à chefia do Poder e
Executivo eram normalmente profissionais liberais, que viviam de seu trabalho, e – fosse na representação de grupos de interesses, ou movidos pela natural ambição política – assumiam as municipalidades com a intenção de bem governá-las. Pelo menos tinham disposição para negociar politicamente com os vereadores e a sociedade, e empregar os recursos em benefício da maioria.
No projeto de desmoralização deliberada da atividade política, os reitores do regime de exceção trataram de solapar a base da incipiente democracia brasileira. Instituiu-se, como primeiro passo, a remuneração dos vereadores. Antes, em quase todos os municípios, a vereança era relevante serviço público, e não remunerado. Em outros, os membros das câmaras municipais recebiam jetons, quase simbólicos, por sessão a que compareciam. A remuneração dos prefeitos tampouco era expressiva. Só nas grandes cidades e nas capitais, que exigiam do chefe do governo municipal atenção de tempo integral, os vencimentos eram razoáveis.
Passando a ser um emprego – e, relativamente, bom emprego – o cargo de vereador passou a ser disputado por pequenos demagogos, sem qualquer noção do bem público. Desse canteiro surgiram inúmeros candidatos a prefeito, da mesma qualidade e do mesmo caráter. O modelo se consolidou e continua a ter efeitos nefastos na formação dos parlamentos. O que antes era exceção – a ignorância instrumental, a debilidade de caráter, a tendência ao peculato – passou a ser regra geral. Só nos últimos tempos, e quase que por milagre, começaram a surgir, em alguns Estados, bons e criativos administradores municipais. Graças a eles está havendo a recuperação de suas cidades, que têm servido de exemplo às outras.
A eclosão desse novo escândalo, quando começa a mobilização pelas eleições municipais deste ano, pode servir de boa advertência às elites das cidades. É o momento de os homens responsáveis, em cada uma delas, reunirem-se em busca de candidaturas, tanto para vereadores quanto para o Poder Executivo, de pessoas honradas, e de se empenharem a fim de que se elejam. O primeiro passo é examinar minuciosamente o passado dos candidatos. O velho lugar-comum continua válido: quando as pessoas de bem se omitem da responsabilidade política, não podem queixar-se dos governos que se formam.
O PMDB ainda não conseguiu recuperar-se dos golpes sofridos nos últimos anos. A morte dos grandes líderes que o conduziram nos ácidos tempos ditatoriais provocou a erosão doutrinária de seus quadros. O partido continua sendo o mais brasileiro de todos, com presença em todas as regiões e em todas as classes sociais, mas lhe falta o ânimo que o empurrou para as grandes jornadas do passado. Para que se recupere é-lhe necessária uma liderança capaz de mobilizar o entusiasmo de seus militantes.
Durante a inauguração de fotos dos grandes fundadores, na sede do partido, alguns parlamentares fizeram apelo ao governador Aécio Neves para que retorne aos seus quadros. Esse apelo não se dirige somente ao governador. Com Aécio, o PMDB, depois de erros graves em Minas, tenta recuperar seu espaço no Estado. O último de seus desacertos foi o de negar legenda ao ex-presidente Itamar Franco, que era o candidato natural de Minas ao Senado da República. Ao optar por essa exclusão, injusta e inepta, o PMDB mineiro não só perdeu uma cadeira na Câmara Alta, uma vez que seu candidato amargou a derrota; o partido encolheu ainda mais, diante da opinião pública de Minas, que se sentiu frustrada em não ter podido eleger Itamar. Para reabilitar-se no Estado, o PMDB busca encostar-se em Aécio.
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